sábado, 14 de março de 2009

A hora da verdade?

Com a reunião preparatória da cimeira dos G20, entre os ministros das finanças dos países que o constituem, inicia-se hoje, 14 de Março de 2009, a contagem decrescente para a realização dos dois acontecimentos que mais expectativas suscitam sobre o futuro económico – e necessariamente político – do planeta, em especial quanto ao que poderá vir a ser o desenho de um novo sistema financeiro mundial. E isso não obstante, neste momento, a economia real provocar mais preocupações que a financeira (que não parou ainda de surpreender com novos ‘escândalos’!), sobretudo devido ao desemprego que ameaça atingir níveis incomportáveis e transformar-se num problema social de consequências imprevisíveis. Contudo, os governos sabem que, no ponto em que ‘esta’ globalização colocou as sociedades actuais, sem a prévia estabilização financeira pouco ou nada podem fazer pela economia real.

Será, pois, das reuniões, primeiro em 20 de Março, na Cimeira Europeia de Praga, e logo depois em 2 de Abril, na conferência dos G20 em Londres, que previsivelmente sairão orientações (ou mesmo decisões) quanto à ‘nova’ estrutura da economia internacional e as linhas mestras do que se espera venham a ser, no futuro imediato, as regras básicas de funcionamento do sistema financeiro (este com dois dos três pontos da agenda, sintomático da importância que lhe é atribuída).

Na Cimeira Europeia, mais que as soluções técnicas para a crise, estará à prova a questão política da própria razão de ser desta União que se pretende mais que económica: será interessante avaliar o poder agregador do projecto europeu em momento de grave crise generalizada (atingindo tanto as economias fortes como as mais débeis e de menor peso), sobretudo através da tensão e correlação de forças que vier a estabelecer-se entre as denominadas ‘organizações regionais’ e o núcleo duro das pesadas locomotivas económicas, Alemanha à cabeça. A prova de fogo acontecerá logo a seguir, na reunião dos G20, pela capacidade em concertar uma posição comum perante as demais potências económicas mundiais, EUA, Japão e China, nomeadamente.

Mas será sobretudo aí, em Londres, para onde convergirá o poder de mais de 90% da riqueza do planeta, que irá emergir a verdadeira natureza das soluções que estão a ser preparadas para ultrapassar ‘esta’ crise: a reforma do sistema financeiro mundial (incluindo a das suas instituições mais representativas, FMI e BM); e medidas de relançamento da economia, o que significa, aqui também, perceber qual o papel destinado à organização internacional mais emblemática da globalização, a OMC.

As dúvidas, relativamente à primeira, centram-se apenas em saber até onde estarão dispostos a ir no tratamento dos ‘off-shores’.

Quanto à dinamização da economia, sabendo-se que o livre comércio é um dos sustentáculos ideológicos ‘desta’ globalização – que todos eles consideram inevitável e até benéfica – seguramente a sua maior aposta continuará a ser a de continuar a privilegiar esse princípio face a qualquer esboço de proteccionismo.

Ora, como toda a gente sabe mas é bom aqui recordar, tem sido a defesa do princípio do livre comércio (considerado vantajoso para todos a longo prazo !), que impôs ‘este’ modelo de globalização, construído na base da compressão e externalização dos custos – gerando esse nefando processo de deslocalizações selvagens de empresas, com as dramáticas consequências conhecidas, sobretudo a nível laboral e ambiental – em detrimento da universalização dos benefícios proporcionados pelos elevados e cada vez mais acessíveis níveis tecnológicos e organizativos.

É por isso que dificilmente se assistirá a qualquer alteração surpreendente, tanto a nível dos off-shores – uma das peças-chave na construção da ‘ideologia’ do livre comércio – quanto no domínio das principais regras em que se baseia a OMC – claramente favoráveis aos países ricos. Ainda assim convirá acompanhar com atenção – não vá a realidade surpreender toda a gente !

Em última análise, será a economia real a decidir o futuro do sistema, com bem mais rigor que o projectado por estes, no fim de contas, corresponsáveis pela crise!

1 comentário:

Carlos Borges Sousa disse...

Excelente e oportuna postagem; no dia 2 de Abril pode(rá) ser que a máscara possa definitivamente cair àqueles – como o caso de Sócrates e do Ministro das Finanças – que estão de forma falaciosa e estrategicamente cobarde - em termos discursivos -contra os offshores.
Na prática, e considerando os múltiplos interesses que defendem e na prática perseguem. querem que muito pouco mude para que no essencial fique tudo na mesma.
Veremos, então, como se comporta(rá) o Estado Português na magna reunião; o que defende(rá) e o que vota(rá) …