segunda-feira, 29 de março de 2010

Uma questão de liberdade(s) ?..

" ... és livre se podes afastar-te dos homens, sem que te obrigue a procurá-los a necessidade do dinheiro, ou a necessidade gregária, ou o amor, ou a glória, ou a curiosidade, que no silêncio e na solidão não podem ter alimento.
Se te é impossível viver só, nasceste escravo.
Podes ter todas as grandezas do espírito, todas da alma:
és um escravo nobre, ou um servo inteligente: não és livre.

E não está contigo a tragédia, porque a tragédia de nasceres assim não é contigo, mas do Destino para si somente.

Ai de ti, porém, se a opressão da vida, ela própria, te força a seres escravo.
Ai de ti, se, tendo nascido liberto, capaz de te bastares e de te separares, a penúria te força a conviveres.
Essa sim, é a tua tragédia, e a que trazes contigo.

Nascer liberto é a maior grandeza do homem, o que faz o ermitão humilde superior aos reis, e aos deuses mesmo, que se bastam pela força, mas não pelo desprezo dela.”

Fernando Pessoa, in «Livro do Desassossego»

segunda-feira, 22 de março de 2010

quarta-feira, 17 de março de 2010

Uma questão de arbítrio(s) ….

" ... Um homem é dotado de livre arbítrio e de três maneiras: em primeiro lugar, era livre quando quis esta vida; agora não pode evidentemente rescindi-la, pois ele não é o que a queria outrora, excepto na medida em que completa a sua vontade de outrora, vivendo.
Em segundo lugar, é livre pelo facto de poder escolher o caminho desta vida e a maneira de o percorrer.
Em terceiro lugar, é livre pelo facto de na qualidade daquele que vier a ser de novo um dia, ter a vontade de se deixar ir custe o que custar através da vida e de chegar assim a ele próprio e isso por um caminho que pode sem dúvida escolher, mas que, em todo o caso, forma um labirinto tão complicado que toca nos menores recantos desta vida.
São esses os três aspectos do livre arbítrio que, por se oferecerem todos ao mesmo tempo formam apenas um e de tal modo que não há lugar para um arbítrio, quer seja livre ou servo."
Franz Kafka - in «Meditações»

quinta-feira, 11 de março de 2010

A propósito, mais uma vez, da produtividade nacional - III

‘Agarrem-me senão eu fujo!’

À parte a resposta às interrogações formuladas no comentário anterior – só por si merecedoras de aprofundamento em pelo menos outros tantos comentários – importa por ora expressar, em complemento de tudo o que ficou dito a propósito deste tema da produtividade nacional, a estranheza pela recorrência com que determinada asserção, atirada em tom de desafio, é produzida tão impunemente.

É vulgar ouvir afirmar-se que a justificação para os desníveis remuneratórios praticados em Portugal visa evitar a ‘fuga de quadros’, acrescentando-se de imediato que ‘a competência paga-se’ e, por isso, o risco que se corre, caso essas competências não sejam devidamente ‘blindadas’ (ou seja, ‘mimadas’ com as mordomias mais obscenas!), é o de os mais competentes poderem ser atraídos por chorudos contratos com que lhes acenam do exterior. ‘Agarrem-me senão eu fujo!’, parecem desafiar, sustentando assim não passarem tais benesses, em face do incorrido risco de uma deserção tão a contragosto (?), apenas de aparentes (porventura até baratos) desmandos.

Pintado assim o cenário, é só esperar que a maior parte dos totós indígenas engulam (sem grandes engulhos...) tamanha boçalidade e aceitem a desconformidade de tais prebendas como se se tratasse de uma fatalidade: caso se verificasse a debandada, então ocorreria o caos, instalar-se-ia a miséria, os maiores opróbrios atingiriam o já tão martirizado povo português! O que justificaria (dados de Manuel António Pina, JN, 24/10/08) que “os portugueses comuns (os que têm trabalho) ganhem pouco mais de metade do que se ganha na zona euro”, enquanto os ‘competentíssimos’ dos nossos gestores se pagam, em média, acima 55% dos suecos e finlandeses (uns bigorrilhas!), ou 22,5% dos franceses (uns pindéricos!).

Haja decoro! Depois do que atrás se disse sobre a qualidade dos ‘nossos queridos gestores’ – com base nos resultados à vista de todos – apetece mesmo dizer: pois que fujam, deixá-los ir embora e... que não voltem mais! O saldo entre as suas apregoadas capacidades e a realidade sentida pela maioria é tão negativo que me atreveria a acrescentar: a sua fuga não só não constituiria qualquer perda, como até poderia traduzir-se numa salutar benção. É que a par de uma tendencial recondução da escala remuneratória média para níveis financeiramente mais sustentáveis e socialmente mais decentes (e menos insultuosos), abrir-se-ia a oportunidade de tantos outros que vêm as suas capacidades bloqueadas por tais crânios, poderem demonstrar que, afinal, são tão ou mais competentes que os que ameaçam fugir para o exterior no encalço de tais miragens.

Temo, contudo, que tal nunca venha a suceder, pela simples razão de que tais ameaças – que não passam disso mesmo, de ameaças – dificilmente algum dia se concretizarão. E é pena, pois assim mais facilmente o país se iria libertando de uma cultura de ‘arrivismo ganancioso’ que lhe vem tolhendo as potencialidades e o impede, seja qual for o sistema económico, de procurar construir uma sociedade mais equilibrada, civilizada e próspera, menos dependente das várias formas de servidão – incluindo a que se acoita na ideologia dos falsos interesses comuns amalgamados em tiradas como a mais recente de Belmiro de Azevedo quando afirma que ‘o país não se pode armar em rico’(...) somos um país pobre’. Qual país? O dele ou o da caixa do Continente a recibos verdes?!!!

Ou de contribuir para a formação de alternativas às estafadas e comprovadamente ruinosas soluções neoliberais responsáveis pela CRISE. Acima de todas a indispensável – e inevitável – reorganização laboral, em torno da redução do tempo de trabalho, o dado central (não o único) a partir do qual será possível equacionar a resolução do problema do emprego (ou do desemprego) – assunto já aqui por várias vezes abordado, mas a que importa voltar sempre, pois constitui um dos elementos estruturantes na resolução da CRISE.

Até lá, dramas humanos continuarão a ocorrer perante a crescente insensibilidade da opinião pública manipulada pelo poder político apostado em reduzir o problema a um mero controle estatístico. E, alheia aos dramas, a CRISE continuará inexoravelmente a aprofundar-se!

segunda-feira, 8 de março de 2010

A propósito, mais uma vez, da produtividade nacional - II

Os porquês: e onde, para além de organização, se alude a ‘certas culturas’

Depois do que se expôs antes, dir-se-á então que o mais importante é mesmo investir na educação, na formação, na investigação (na inovação tecnológica, em novos métodos e processos,...). Mas não foi isso que se fez nos últimos (pelo menos) 25 anos? Com financiamentos do Estado a taxas iguais (ou mesmo superiores) às da maioria dos países europeus? E nem por isso os resultados deixam de ser modestos? Que dizer, então, do desperdício que representa manter milhares de jovens recém-licenciados no desemprego ou em actividades sem qualquer exigência de qualificação? Ou da contradição de potenciais quadros desaproveitados num país que se diz carecido deles?

Desde logo, ninguém ousará contestar que boa parte da responsabilidade a apurar neste processo reside na forma como esses investimentos são feitos – prioridades mal definidas, corrupção,... (mais um problema de gestão e de quem decide), resultando na falta de qualidade do ensino e da investigação produzidos. Contudo, a explicação não deve ser procurada apenas na ‘baixa qualificação dos recursos’, pois também aqui as comparações externas dos ‘nossos’ gestores, quando colocados lá fora em condições idênticas às de cá de dentro, não nos situam muito fora dos padrões internacionais.

Resta, pois, tentar procurar no próprio modelo de organização social (incluindo na componente económica) uma explicação mais cabal das causas deste atavismo nacional – a endémica baixa produtividade lusa. A violência da actual crise apenas veio expor, acentuando os seus efeitos humanos de uma forma estrondosa e dramática, aquilo que há muito se sabia ser insustentável e que era manter por muito mais tempo um ‘modelo de especialização produtiva’ baseado preferencialmente em actividades pouco qualificadas e de baixos salários. A prolongada aposta num modelo mal protegido tecnologicamente (portanto mais vulnerável à concorrência externa...), mas que, em contrapartida, permitia lucros rápidos, apenas demonstra a natureza retrógrada, porque desfasada da realidade e do progresso, dos responsáveis por tais opções, antes de mais dos empresários – do capital no seu conjunto.

O aprofundamento desta questão levar-nos-ia porventura a interrogar a razão deste comportamento aparentemente tão idiossincrático por parte das nossas elites nacionais (pelo menos no confronto com algumas das suas congéneres europeias), antes de mais os empresários (como gostam de se ouvir intitular), e estes contando com o inestimável apoio dos políticos. E a resposta pode bem conduzir-nos (?) a uma estranha mescla histórica em que se conjuga o tão decantado espírito aventureiro do tempo das navegações (em que o principal móbil sempre foi a obtenção rápida de riquezas fáceis através do comércio ou mesmo da pilhagem), com a repressão inquisitorial a que concomitantemente foram sujeitas as mentes de então (e que perdura ainda em muitas manifestações actuais). Hipóteses a investigar, claro, na busca de uma explicação que tente apurar as razões, objectivas e subjectivas, de um comportamento tão diferenciado das restantes elites europeias, não obstante todas elas actuarem, servindo-se, sob o pano de fundo de um sistema que, na sua essência, é o mesmo.

Não havendo, de facto, nenhuma diferença substancial, o certo é que ‘uns’ vivem de forma bem mais desafogada do que ‘outros’. Pena, pois, que as decisões que nos afectam não atinjam só aqueles que as tomam, antes arrastem no fragor da queda todos quantos – afinal homens e mulheres de carne e osso! – eles se servem para atingir os seus propósitos e o exclusivismo de vidas tão requintadas.

Porque, no final, uma interrogação geral começa já a pairar no ar, acusadora: onde estão os efeitos da crise para alguns? Onde está, antes de mais, a CRISE para os que a provocaram e dela se serviram? Ou, ainda – e talvez se descubra aqui a ponta do novelo que nos poderia conduzir à solução do problema – porque é que nos pretendem fazer crer que os remédios para a crise estão, afinal, nas causas que a determinaram?

(...)

Dia Internacional da Mulher : 100 anos ...

Cem anos passam desde que Clara Zetkin propôs o dia 8 de Março como Dia Internacional da Mulher, na II Conferência Internacional de Mulheres Socialistas.

Muitas histórias se contam sobre a origem deste dia e muitas lutas importantes se seguiram.

O Esquerda.net publica um dossier com o relato e a análise destes acontecimentos.Ler Mais

( via : www.esquerda.net )

domingo, 7 de março de 2010

quinta-feira, 4 de março de 2010

A propósito, mais uma vez, da produtividade nacional - I

Os quês: por aqui se fala de mandriões e de mandões!

Volta e meia regressa à cena política e mediática a discussão sobre a produtividade nacional. Esta persistente recorrência do tema não surge por acaso, visa objectivos bem definidos, invariavelmente procurando perante a opinião pública justificar a aplicação de ‘políticas de correcção’(!), eufemismo com que se pretende apresentar como inevitável uma maior contenção nos rendimentos do trabalho.

Não admira, pois, que o assomo de qualquer nova onda na crise económica, faça ressurgir, agora e sempre, a explicação da falta de competitividade da economia portuguesa perante as suas congéneres europeias (é este o espaço em que se integra, até aqui nada de mais), dado o nosso atávico desnível neste domínio. O argumento é invocado, claro, para se concluir que, (1) se a produtividade do trabalho nacional é baixa, (2) é porque os custos da respectiva componente laboral no PIB são comparativamente muito elevados, (3) logo, a solução, inevitável, passa por se reduzirem esses custos – por baixar/depreciar o trabalho (a começar pelo salário)!

Vai-se tornando cansativo, frustrante, deprimente mesmo, o insistente relambório de que as causas de todos os males do país radicam na sua baixa produtividade, o que visa essencialmente justificar as políticas de constante desvalorização do trabalho – a única variável ‘tolerada’ pelo mercado para proceder aos indispensáveis ajustamentos externos, seja nas contas nacionais ou nas empresas, por via da redução salarial ou da precariedade do emprego!

Pondo de lado o facto (por vezes decisivo) da competitividade de um país não depender apenas da produtividade, vale a pena ‘perder’ algum tempo a reflectir sobre o contributo dessa (sempre decisiva) componente na criação da riqueza nacional, o trabalho. Desde logo para a formulação da pergunta sacramental: se a baixa produtividade continua a manter-se como uma pecha peçonhenta que deprime o país e afasta o maná dos investimentos externos (entre outras bem-vindas bem-aventuranças), a que se deve? Uma resposta imediata, quase por reflexo, aponta, acusadora, os ‘mandriões dos trabalhadores’ em geral (com honrosas excepções, concede-se!), todos reivindicam direitos ninguém está disposto a cumprir obrigações, gente disposta a fazer o mínimo mas a exigir o máximo e... “assim não vamos lá”, rematam, peremptórios!

Mas... quais trabalhadores? Os mesmos que, lá fora, num qualquer país estrangeiro, nas mais diversas situações e funções, se esforçam e dão muito bem conta do recado (não alinho nem vou ao ponto de afirmar serem dos melhores do mundo, basta-me que sejam iguais), mas quando em idênticas situações, cá dentro, produzem muito menos e não passam de uns... ‘calões’?

Decididamente algo aqui não bate certo. E daí que desde logo haja de esclarecer-se: a causa da baixa produtividade não está em trabalhar mais, mas em trabalhar melhor, não está em despender mais esforço, mas em reproduzir esse esforço de uma forma mais organizada. O problema é, mesmo, ORGANIZAÇÃO. E se a ‘culpa’ é da organização – ou da falta dela – então os ‘culpados’ são, em primeira instância, os... gestores e organizadores, todos os que têm de a formular, planear e aplicar, enfim, os decisores em geral – não são apenas ‘mandões’ na política ou nas empresas, eles ‘mandam’ também na produtividade!

Afinal os principais responsáveis pela tão persistente e vilipendiada baixa produtividade são os mesmos que a invocam como argumento (dá jeito em momentos como este), para extraírem mais umas migalhas aos milhões de pedintes em que o país se vai transformando... presumidamente por falta dela. Porque de um modo geral são eles que têm governado o país, definido e imposto – dela se servindo – esta ORGANIZAÇÂO: tanto no Estado, como nas empresas, a nível da sociedade global!

Sobre que elaboram, então – de que se queixam, enfim – os cerca de ‘200 opinion-makers’ (talvez nem tantos!) que ‘fazem’ a opinião pública nacional – para depois ‘falarem’ em nome dela (se afirmam traduzir o pensamento da maioria!) – quando apontam a ‘baixa produtividade nacional’ como a origem de todos os problemas?

(...)

quarta-feira, 3 de março de 2010

A resposta para a crise …

De facto, e em meu entender, a austeridade não é - nem pode(rá) ser - a única resposta para a crise …
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