Sarkozy e Merkel – ou melhor, Merkel e Sarkozy (e não, não
é por cavalheirismo) – parecem viver ‘juntos’ há um ror de tempo. Quando
aparece um, o outro está sempre por perto, ou a chegar de algum lado. Para onde
vai um, vai o outro, como até no caso da Líbia (?). E não é devido à gravidez
da Bruna ou a qualquer pretensa infidelidade de ambos, porque a aparência que
transmitem, não obstante tão íntimo e desavergonhado conúbio, é de se tratar de
dois seres assexuados, não creio que qualquer deles suscite, deste ponto de
vista, mais que um suspiro de enfado e passe adiante.
A razão da aparição frequente do ‘casal’ mais badalado do
momento e a constante novela mediática em torno dos seus encontros, deste
permanente ‘tête-à-tête’, bisonho e de mau augúrio, prende-se, aparentemente,
com algo que diz respeito a todos os países da União Europeia: encontrar os
meios de ultrapassar a crise financeira das denominadas ‘dívidas soberanas’!
Mas a forma como estes assumidos donos da Europa passeiam a sua dominação, à
revelia desde logo das próprias instituições comunitárias, torna-se humilhante
para os restantes membros da UE. E é sintomático o silêncio cúmplice da
generalidade de todos eles, submetidos ao estranho temor de caírem desamparados
na vertigem financeira desencadeada pelas referidas dívidas.
A frequência destes encontros,
contudo, vai de par com a total inutilidade dos mesmos, está na razão inversa
da sua importância para o futuro real da Europa e dos europeus. Pelo menos até
agora, às portas da já inadiável reestruturação da dívida grega. O
resultado de tais encontros manifesta-se sobretudo no sobe e desce das Bolsas,
numa reacção reflexa dos ‘histéricos’ mercados, sedentos de notícias inócuas
para, sobre elas, justificarem os movimentos financeiros que melhor garantam os
seus interesses.
Já se percebeu que a Merkel
multiplica as declarações de apoio à Grécia, não pelo acrisolado amor ao ‘povo
helénico’ ou à sua história, mas pelo especial desvelo que lhe merece a saúde
periclitante dos bancos alemães, empenhados até ao tutano na dívida grega. Se a
Grécia falir arrastará na queda muito mais do que apenas os flagelados (e
descartáveis) interesses gregos, os efeitos da hecatombe repercutir-se-ão na
Alemanha de forma estrondosa e no colapso de toda a Europa (e por
arrastamento no mundo globalizado, resta ver em que medida)[1].
Entretanto, o Governo, qual moço
de recados, viaja de Berlim a Paris (com escalas ‘menores’ noutros destinos,
para disfarçar), busca o assentimento de Merkel, implora o apoio de Sarkozy, em
pose submissa e reverente, regressando com propósitos contrários dos que
levara. O volte-face é o triste sintoma da desorientação política de um
Governo cheio de certezas e de receitas milagrosas na oposição – em
busca de razões plausíveis para calar o protesto contra a austeridade e a
trapacice logo que chegou ao poder!
Sente-se a desorientação até por entre a afanosa plêiade
de analistas e comentadores, correndo pressurosos a tentar tapar os inúmeros
buracos que a ortodoxa política oficial vai provocando, saltando da
explicação/justificação da ‘inevitável’ austeridade para a desculpabilização da
trapacice dos processos jardinistas na Madeira; da exaltação do produtivismo
germânico para a expiação da suposta inépcia grega; da maior eficiência na
gestão pública para a apologia das privatizações ‘sob pressão’ (!); das
virtudes da liberalização desestatizante para o reforço do Estado securitário,...
[1]
Se o Euro desaparecer, estima a UBS, os efeitos sobre o PIB dos países europeus
no 1º ano será devastador, não só nos periféricos, sem dúvida os mais afectados
(40 a 50% de queda), mas igualmente na Alemanha (25%), por via da quebra nas
exportações face à consequente hipervalorização da sua moeda.