segunda-feira, 8 de março de 2010

A propósito, mais uma vez, da produtividade nacional - II

Os porquês: e onde, para além de organização, se alude a ‘certas culturas’

Depois do que se expôs antes, dir-se-á então que o mais importante é mesmo investir na educação, na formação, na investigação (na inovação tecnológica, em novos métodos e processos,...). Mas não foi isso que se fez nos últimos (pelo menos) 25 anos? Com financiamentos do Estado a taxas iguais (ou mesmo superiores) às da maioria dos países europeus? E nem por isso os resultados deixam de ser modestos? Que dizer, então, do desperdício que representa manter milhares de jovens recém-licenciados no desemprego ou em actividades sem qualquer exigência de qualificação? Ou da contradição de potenciais quadros desaproveitados num país que se diz carecido deles?

Desde logo, ninguém ousará contestar que boa parte da responsabilidade a apurar neste processo reside na forma como esses investimentos são feitos – prioridades mal definidas, corrupção,... (mais um problema de gestão e de quem decide), resultando na falta de qualidade do ensino e da investigação produzidos. Contudo, a explicação não deve ser procurada apenas na ‘baixa qualificação dos recursos’, pois também aqui as comparações externas dos ‘nossos’ gestores, quando colocados lá fora em condições idênticas às de cá de dentro, não nos situam muito fora dos padrões internacionais.

Resta, pois, tentar procurar no próprio modelo de organização social (incluindo na componente económica) uma explicação mais cabal das causas deste atavismo nacional – a endémica baixa produtividade lusa. A violência da actual crise apenas veio expor, acentuando os seus efeitos humanos de uma forma estrondosa e dramática, aquilo que há muito se sabia ser insustentável e que era manter por muito mais tempo um ‘modelo de especialização produtiva’ baseado preferencialmente em actividades pouco qualificadas e de baixos salários. A prolongada aposta num modelo mal protegido tecnologicamente (portanto mais vulnerável à concorrência externa...), mas que, em contrapartida, permitia lucros rápidos, apenas demonstra a natureza retrógrada, porque desfasada da realidade e do progresso, dos responsáveis por tais opções, antes de mais dos empresários – do capital no seu conjunto.

O aprofundamento desta questão levar-nos-ia porventura a interrogar a razão deste comportamento aparentemente tão idiossincrático por parte das nossas elites nacionais (pelo menos no confronto com algumas das suas congéneres europeias), antes de mais os empresários (como gostam de se ouvir intitular), e estes contando com o inestimável apoio dos políticos. E a resposta pode bem conduzir-nos (?) a uma estranha mescla histórica em que se conjuga o tão decantado espírito aventureiro do tempo das navegações (em que o principal móbil sempre foi a obtenção rápida de riquezas fáceis através do comércio ou mesmo da pilhagem), com a repressão inquisitorial a que concomitantemente foram sujeitas as mentes de então (e que perdura ainda em muitas manifestações actuais). Hipóteses a investigar, claro, na busca de uma explicação que tente apurar as razões, objectivas e subjectivas, de um comportamento tão diferenciado das restantes elites europeias, não obstante todas elas actuarem, servindo-se, sob o pano de fundo de um sistema que, na sua essência, é o mesmo.

Não havendo, de facto, nenhuma diferença substancial, o certo é que ‘uns’ vivem de forma bem mais desafogada do que ‘outros’. Pena, pois, que as decisões que nos afectam não atinjam só aqueles que as tomam, antes arrastem no fragor da queda todos quantos – afinal homens e mulheres de carne e osso! – eles se servem para atingir os seus propósitos e o exclusivismo de vidas tão requintadas.

Porque, no final, uma interrogação geral começa já a pairar no ar, acusadora: onde estão os efeitos da crise para alguns? Onde está, antes de mais, a CRISE para os que a provocaram e dela se serviram? Ou, ainda – e talvez se descubra aqui a ponta do novelo que nos poderia conduzir à solução do problema – porque é que nos pretendem fazer crer que os remédios para a crise estão, afinal, nas causas que a determinaram?

(...)

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