sexta-feira, 12 de junho de 2009

A dureza destes tempos que correm ...

“Nos últimos tempos, preocupava-o sobretudo as misérias das classes – por sentir que nestas democracias industriais e materialistas, furiosamente empenhadas na luta pelo pão egoísta, as almas cada dia se tornavam mais secas e menos capazes de piedade.
A Fraternidade - dizia ele numa carta de 1886, que conservo - vai-se sumindo, principalmente nestas vastas colmeias de cal e pedra onde os homens teimam em se amontoar e lutar; e, através do constante deperecimento dos costumes e das simplicidades rurais, o Mundo vai rolando a um egoísmo feroz.
A primeira evidência deste egoísmo é o desenvolvimento ruidoso da filantropia.
Desde que a caridade se organiza e se consolida em instituição, com regulamentos, relatórios, comités, sessões, um presidente e uma campainha, e do sentimento natural passa a função oficial – é porque o homem, não contando já com os impulsos do seu coração, necessita obrigar-se publicamente ao bem pelas prescrições dum estatuto.
Com os corações assim duros, que vai ser dos pobres?…”
( Eça de Queirós, in “A Correspondência de Fradique Mendes” )