domingo, 14 de junho de 2009

Uma leitura pós-eleitoral

II – A crise na Esquerda europeia

A vitória das forças conservadoras nas eleições europeias avivou um tema recorrente: qual a razão de a Esquerda (toda a esquerda), não ser capaz de se constituir como alternativa firme de esperança (tanto para os que perderam já o emprego, quanto para os que protegem a sua ainda cómoda posição actual) ou de confiança (na terminologia do BE) ao modelo de desenvolvimento que tudo aposta num crescimento ilimitado – de que resultou, afinal, a presente crise – e cujo aprofundamento, a nada se inverter, é inevitável que aconteça?

Sem menosprezo pelas explicações que atribuem ao controle dos meios ideológicos (estruturas hierárquicas, aparelho do Estado, comunicação social,...) o factor determinante na orientação das consciências dos cidadãos eleitores, o certo é que a sua operacionalidade, do ponto de vista dos resultados, tem-se demonstrado muito limitada e parcelar, o que implica dever tentar encontrar-se outra via mais eficaz e mais abrangente. Importa, assim, aprofundar duas ordens de razões a que, apenas para efeitos de arrumação, se atribuiu a distinção entre objectivas e subjectivas.

Desde logo, razões objectivas derivadas da própria realidade concreta, seja de natureza material, económica ou social e que, perante a perspectiva da mudança inevitável, se pode resumir na seguinte proposição: as pessoas só aceitarão mudar o seu estilo de vida se (ou quando) a isso forem obrigadas. O que vale por dizer que só mudarão quando a realidade, material, económica ou social (grandes convulsões, por exemplo), lhes bater à porta – ou lhes cair em cima das próprias cabeças (nem sempre resulta o exemplo do ‘vizinho’, como se comprova agora com a presente crise).

Mas também razões subjectivas que se prendem com a natureza das propostas e a incoerência das práticas dos partidos socialistas tradicionais (incluindo as diferentes social-democracias – com exclusão, porventura, do exemplar nativo, o PSD, socialmente eclético e ideologicamente indefinido, politicamente enquadrado no conservadorismo liberal do PPE), até agora maioritários na Esquerda, essencialmente devido a:
- No campo das propostas – por se demonstrarem incapazes de apresentar (e delinear) um modelo alternativo consistente (na resposta à crise), viável e perceptível, consensual, o bastante, para permitir convergências alargadas.
- Quanto à incoerência das práticas governativas (nos casos em que têm vindo a ser chamados a desempenhá-las) – porque de um modo geral se têm destacado mais como gestores de um modelo que, em teoria, são até capazes de criticar, mas que, na prática, não têm rebuços em aplicar, por vezes até com maior zelo que os seus indefectíveis defensores.

O que de modo algum contribui, perante o eleitorado ou o cidadão em geral, para estabelecer as diferenças essenciais. Antes pelo contrário, apenas acentua a convicção do eleitor comum de que, afinal, não há diferenças significativas entre a prática dos diferentes partidos que se revezam no poder de forma rotativa, independentemente da ideologia que digam professar. Com claro prejuízo, como é óbvio, para a democracia em geral, mas sobretudo para a Esquerda – tanto a que participa no denominado ‘arco governativo’, pelos equívocos que gera no eleitorado, quanto a independente, que se tem vindo a afirmar de forma consistente mas necessariamente difícil, atento este condicionalismo – pois até o eleitor menos informado ou motivado politicamente é capaz de distinguir entre a cópia e o original. E, em tais circunstâncias, a opção é clara.

Importa, então, adquirir capacidades para promover um programa de acção, assente num modelo de desenvolvimento alternativo, mas consistente, viável, perceptível e consensualmente alargado. Mesmo que a sua aplicação prática pareça, no imediato, inexequível ou até fora de propósito. Convenhamos, só tem possibilidade mesmo de ser exequível aquilo que o pensamento único liberal decreta que o possa ser!!! Contrariar esta submissão ao ‘dictat liberal’ não é tarefa fácil, mas é imperioso que se tente – de acordo com os princípios atrás enunciados, em nome do futuro.
(...)

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