sábado, 7 de junho de 2008

VI – Reflexões a propósito de um encontro das esquerdas

Uma conclusão (sempre) inacabada

Torna-se essencial e é mesmo prioritário desfazer o equívoco que mina alguma esquerda (a maioritária, por enquanto) de que é possível a conciliação entre os valores do socialismo e a auto-regulação da economia centrada no mercado (mesmo que apoiado em inúmeros reguladores, destinados a evitarem os seus excessos). Enquanto o ‘equívoco liberal’ subsistir e os valores do mercado se sobrepuserem aos valores do socialismo, é o próprio objectivo histórico de emancipação do Homem, que se encontra comprometido. Desfeitos alguns equívocos em torno do valor da liberdade, importa agora afrontar o mito do mercado, desta feita atingindo o sistema mesmo no seu âmago.

Tal como o primeiro se demonstrou decisivo na imprescindível clarificação, dentro do sistema, dos valores constitutivos da democracia (a relação liberdade-igualdade), a tarefa de reduzir o mercado ao seu âmbito natural (agora contra o sistema) apresenta-se basilar e estratégica para o próprio futuro da Humanidade: está em causa uma alternativa ao sistema capitalista, uma alternativa global, viável, coerente e decente à força destruidora que o modelo fundado no primado do mercado tem representado para os limitados recursos do planeta e para o Homem.

Ora, a base de entendimento indispensável à constituição de uma alternativa coerente de esquerda a este modelo de desenvolvimento (que nos arrasta, tudo o indica, para uma grave crise global, de consequências imprevisíveis), passa necessariamente pela ultrapassagem do ‘equívoco liberal’. Isto significa, antes de mais, retirar ao mercado o papel de centro de decisão social e política que actualmente representa, mantendo-lhe apenas as funções de regulação económica para que foi criado. Pretender, como sustentam alguns bem intencionados derrotistas, que o modelo de organização social centrado no mercado é inevitável, com o argumento de que se não vislumbram alternativas viáveis, corresponde à aceitação serôdia da tese do ‘Fim da História’, hoje já até rejeitada pelo seu autor (F. Fukuyama).

Mais que não seja pela maior sensibilidade social que tradicionalmente lhes é atribuída, cabe às esquerdas, a todas as esquerdas conscientes dos riscos que a perigosa situação social actual comporta, a responsabilidade histórica de demonstrarem que um outro modelo de organização social é possível, o que implica a adopção de uma atitude política de maior diálogo e abertura a diferentes pontos de vista. Precisamente na linha do iniciado pelo encontro ‘Agora Aqui’.
É que – sublinhe-se mais uma vez e com toda a ênfase – o que cada vez parece estar mais em causa, afinal, dependente do sucesso dessa alternativa, é muito mais que o triunfo de uma ideologia, é o próprio futuro da Humanidade.

2 comentários:

Carlos Borges Sousa disse...

Carísssimo,
E ... para não variar, desta feita em VI Capitulos, uma excelente reflexão que, como diz e bem, com
"uma conclusão (sempre) inacabada"

VRMendes disse...

Um assunto relatado em seis capítulos que dá para pensar no saco em que estamos metidos.