sábado, 18 de junho de 2011

E pur si muove...

“Toda a verdade passa por três fases: primeiro é ridicularizada, depois violentamente hostilizada e por último aceite como natural (evidente por natureza).”
(Schopenhauer)

Retiro esta frase de um blog canadiano (Northerntruthseeker), aonde chego pela via do costume, pela ‘net’. Para além do que a frase sugere, o blog alerta-me ainda para outras interessantes realidades (ao arrepio do idealismo pessimista deste filósofo – que não frequento – prefiro antes falar em ‘realidades’, as ‘verdades’ são mais do domínio da ética). Cito-a a propósito de uma realidade que, depois de inicialmente ridicularizada, até já violentamente hostilizada por alguns sectores (pelo menos), começa agora a impor-se como solução natural e lógica. Refiro-me, naturalmente, ao tema da reestruturação da dívida.

Primeiro foi Roubini a falar no que muitos outros já haviam dito antes, embora sem a auréola de ‘mago e adivinho’ que os ‘insondáveis’ desígnios dos ‘media’ lhe foram atribuindo: (1) que se caminha para o fim anunciado do ‘euro’ (falou em ‘cisão’, mas para o caso significa o mesmo); (2) que a reestruturação da dívida vai mesmo acontecer (resta saber quando e como).

Desde o início da construção do ‘euro’ se sabia (sabiam todos) que, para ter sucesso, o destino inevitável de uma união monetária teria de passar, mais cedo ou mais tarde, para uma fase política superior, previsivelmente a constituição de uma federação dos Estados nela integrados. Independentemente de se ser favorável ou não a tal destino, sabia-se (todos sabiam) que, por razões de natureza orçamental e fiscal, algures no seu percurso, era forçoso que a união monetária, para sobreviver, evoluísse para a união política. A pequenez dos actuais líderes europeus, contudo, impede-os de ver para além da sua própria sombra e outro destino parece irreversível: a extinção (gradual ou rápida, está para ver-se) do projecto de União Europeia.

Agora surgem notícias de que a China – que, como todos sabem, tem os EUA nas ‘mãos’, literalmente suspensos do seu poder financeiro – prepara-se para comprar partes do território americano (anuncia-se, para já, o sul de Boise, capital do conservador Estado do Idaho, que já foi far-west e parece aprestar-se para o voltar a ser, mas muitas outras zonas tencionam seguir-lhe o rasto) para aí instalar – pasme-se – aquilo que, durante anos, constituiu o espanto do Ocidente, o enxerto capitalista de Deng Xiaoping no comunismo chinês de Mao, na versão ‘um país, dois sistemas’, através de ‘zonas económicas especiais’, com leis próprias diferentes das do restante território nacional.

Abstenho-me de aprofundar aqui em que se traduz e o que significa a autonomia destas ‘zonas’, qualquer consulta à ‘Wikipedia’ fornecerá mais informação do que eu, mesmo que o quisesse, poderia adiantar. Mas será interessante seguir a concretização deste tipo de projectos agora implantados em território capitalista (reversão do lema chinês para ‘dois países, um sistema’?), dispondo de liberdade para impor normas diferentes das que vigoram nos restantes EUA, apenas porque estes, exauridos de recursos financeiros e na dependência económica do ‘comunismo’ chinês (!), aceitam submeter-se ao poder ditado, em teoria, pelas leis do mercado.

Não sei quem nesta Europa das nações (avessa à mais pequena redução de soberania por via federal ou outra, como o comprova o presente impasse da resolução das ‘dívidas soberanas’), admitisse, em nome do livre curso do mercado ou como forma de solver compromissos (financeiros ou outros), ceder parte da soberania dos respectivos territórios para neles se instalar uma qualquer outra potência estrangeira (travestida ou não de corporação empresarial), com capacidade para impor leis diferentes das que vigoram a nível do país em parcelas destacadas do todo nacional.

O que nos reconduz às conclusões de Roubini. Mas a alternativa da reestruturação das dívidas começa ela também a evidenciar prematuro desgaste, pois quanto mais tarde ela for tentada mais se agravam as condições da dívida e se reduz a margem de êxito. Que muito depende de uma prévia e rigorosa auditoria para se perceber o que é devido do que foi imposto pela escalada especulativa desencadeada por agentes de uma rede de interesses que importa identificar.

Assim, apenas a sua conjugação com uma saída a prazo do euro parece cada vez mais poder vir a demonstrar-se capaz de inverter a actual situação de continuada estagnação económica. A relutância das políticas comunitárias em encarar uma solução global para a Europa poucas dúvidas já permitem sobre a sua mais que provável derrocada. Pelo contrário, tudo têm feito, consciente ou de forma leviana, para lhe apressar o fim anunciado.

Perante a magnitude do que isto envolve, que relevância atribuir ao alterne nas cadeiras do poder, em torno da constituição do novo Governo, destinado a gerir programas alheios?

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