sábado, 19 de fevereiro de 2011

A censura do pensamento único à moção de censura – II

... xeque aos políticos, aos comentaristas políticos e aos políticos comentaristas!

Percebe-se o tom irritado e a incomodidade que o anúncio da moção de censura do Bloco ao Governo provocou sobretudo por entre aqueles que tinham como certo ser eles a marcar o calendário para a sua apresentação. A notícia alterou-lhes os cálculos e precipitou os acontecimentos, agora vão ser obrigados a exporem-se e a definirem-se mais cedo do que esperavam e lhes era propício (ou a arranjarem desculpas esfarrapadas...), pois deixaram de poder manipular as datas apenas conforme os seus interesses pessoais ou partidários.

Durante muito tempo, perante a desastrosa situação social em que o País se encontra (por opções políticas próprias mas, também, influências alheias), a questão era saber-se quando é que uma moção de censura iria confrontar os responsáveis por tal descalabro. E se, até aí, todos admitiam ela poder acontecer a qualquer momento (comentadores), ou ameaçar desencadeá-la (partidos tradicionais, PSD, CDS, PCP) – a sua concretização dependia apenas do calculismo partidário, às malvas os ‘superiores interesses do País’! – a partir daí a mesma gente, comentadores e partidos, uniram-se para verberar uma posição que qualificam de irresponsável, aventureira, incongruente,... No fim de contas, embora todos a desejassem, ninguém se atrevera a lançá-la! Até agora...

O pensamento politicamente correcto (e até algum desalinhado) apressou-se a condenar a iniciativa, considerando-a (no mínimo) arriscada face à situação de dependência financeira do País, por poder ‘irritar’ ainda mais os sempre susceptíveis mercados! No meio deste alinhamento geral, alguns arriscam apressadas considerações sobre aqueles aspectos da vida real que parecem querer afrontar este estranho unanimismo: o crescente desemprego, a falta de perspectivas (nomeadamente para os jovens), a degradação dos serviços sociais,... A par da manutenção de privilégios corporativos, de remunerações e bónus milionários a gestores, dos benefícios fiscais aos Bancos,... Depressa, porém, retomam a compostura e a ‘normalidade’ do discurso, com receio de perderem credibilidade no meio mediático (ou até, quem sabe, poderem vir a ser considerados... desalinhados). Tudo em nome da estabilidade do País e do receio da ira dos mercados – a que se subordinam reverencialmente!

Não parece que a crítica centrada nos efeitos políticos imediatos de uma moção desta natureza (face à sua demarcação ideológica e dimensão reduzida dos apoios parlamentares) – ineficaz no derrube ao Governo, exposta à detracção pelo momento escolhido, apodada de inconsequente face ao contexto do seu anúncio,... – consiga ilidir a contínua degradação das condições de vida e a crescente insatisfação social. Ou mesmo desvalorizar uma iniciativa política deste tipo no questionamento das medidas para enfrentar a grave crise social. A fronteira entre esta e a eclosão de revoltas populares ameaça ceder, perante a inércia (ou falência?) das alternativas políticas, como o demonstra a contestação que alastra pelo Mundo, incluindo na Europa desenvolvida.

Medir a utilidade de um acto, seja económico ou político, apenas pelo seu resultado imediato (ou mesmo pelos seus efeitos próximos) é cair na armadilha da ideologia do mercado de avaliar tudo pela eficácia, é aceitar, sem as contestar, as regras ditadas pelo pensamento único, a primeira das quais é a inevitabilidade do real – precisamente o domínio do mercado! – de onde decorre a tese da imutabilidade das relações sociais.

Passado o efeito de surpresa deste anúncio e dando-se como certa a sua rejeição, fazem-se já apostas para se saber qual o momento em que o PSD, o partido melhor posicionado e mais interessado na ‘aritmética da coisa’, irá atacar o poder (com ou sem moção de censura), porventura naquele momento em que as políticas (que ele próprio avalizou) se tornem tão insuportáveis que não permitam alternativa à alternância. Até lá, a gestão do tempo que resta, não tenho dúvidas, certamente se regerá pelo aviso de um bem alinhado director de um semanário apelando à não precipitação das hostes laranjas, pois ‘a ideia de que o PSD está ansioso por subir ao poder ser-lhe-á fatal. Mais do que nunca, os sociais-democratas precisam de saber controlar a ansiedade’!!! Desde logo a ânsia, digo eu, de que a execução orçamental desta 'política de ruína' corra mal. Lindo!

E muito edificante, sem dúvida!

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