segunda-feira, 28 de dezembro de 2009

O dilema civilizacional que condiciona o emprego

Há qualquer coisa de perverso nas políticas económicas desenvolvidas por todo o Mundo para fazer face à crise, pois aquilo que todos parecem encarar como solução incontornável para lhe fazer frente, afinal demonstra-se, a longo prazo e nas condições actuais de funcionamento das sociedades (que já por mais de uma vez abordei), ser a fonte dos problemas com que presentemente se confrontam.

A maior preocupação actual dos governos de todo o Mundo, pelo menos nos discursos públicos, é a de procurarem criar empregos para fazerem face aos destruídos pela crise. Desdobram-se em esforços na elaboração de programas e na busca de investimentos, públicos e privados, tendo em vista apoiar as empresas, esperando, por via destas, impulsionar o emprego. Uma das áreas que tem vindo a ser mais estimulada nesses programas económicos, elaborados um pouco por toda a parte para combater o desemprego – uma séria ameaça à estabilidade social! – é, a par da educação e da formação profissional, a de promoverem a investigação, como forma de se ‘inventarem’ novos empregos. Ainda agora, em França, o governo de Sarkozy anunciou aquilo que a imprensa designou por um ‘megaplano de investimentos’, precisamente orientado nesse sentido: ele é, ‘apenas’, o maior das últimas décadas!

Por detrás destes programas a convicção de que só será possível ultrapassar a crise se forem criadas/inventadas novas ocupações económicas capazes de suprir os empregos desaparecidos, que todos consideram já definitivamente extintos. O objectivo é, invariavelmente, ganhar posições na competitividade externa, descobrindo, produzindo e comercializando aquilo que ainda ninguém antes se tinha lembrado de fazer – preencha ou não funcionalidades socialmente úteis (desde que venda...!). Esperando, deste modo, ficar até melhor defendidos para as próximas crises...

A importância estratégica destas prioridades não oferece contestação, sejam quais forem as circunstâncias ou as situações, tanto no presente como também já no passado, em Portugal como na França ou na China, ainda que ganhem especial acuidade agora face à pressão social que resulta dos níveis generalizados de desemprego. Com a natural especificidade geográfica e histórica de cada situação concreta. Mas a lógica que explica a razão de ser de tais opções, inserida na dinâmica de progresso que acompanha o homem, determina também, como resultado natural dos desenvolvimentos técnicos conseguidos, a consequente redução do esforço humano aplicado no trabalho.

Contudo, a realidade está longe de se ajustar ou subordinar às determinações da lógica. Pois aquilo que se apresentaria, então, como resultado natural de um processo de substituição do esforço individual das pessoas (o trabalho manual) por uma crescente intervenção das máquinas e da inteligência artificial, esbarra não nos limites da técnica mas nos interesses particulares dos grupos sociais que dominam a organização social do capitalismo através de condições específicas impostas a nível mundial: globalizada no seu nível económico, mantida nos limites nacionais a nível político – o que permite todo o tipo de chantagem com base na constante ameaça da ‘deslocalização de empresas’! Daí assistir-se hoje, no campo laboral, a situações aparentemente contraditórias ou mesmo absurdas (por vezes até na mesma empresa!!!), de pressão/imposição patronal de alargamento dos horários de trabalho, a par... do aumento do desemprego!

A redução do esforço humano na produção de bens e serviços (para além do incremento da produtividade e da riqueza) é o resultado natural e inevitável da investigação/inovação e seus consequentes avanços tecnológicos, pelo que ganha consistência um autêntico dilema civilizacional, de resolução quase impossível no imediato, dadas as referidas condições económicas e políticas mundiais: ouesta’ organização social muda e se adapta ao progresso técnico, ou a precariedade do emprego e o desemprego terão tendência para aumentar para níveis cada vez mais socialmente insustentáveis.

No fim de contas, o futuro do emprego, para além de todos os bem intencionados esforços em o redimir, encontra-se, em última análise, preso da resolução deste dilema!

1 comentário:

Diogo disse...

Meu caro, estou absolutamente de acordo consigo.

Abraço