quarta-feira, 14 de novembro de 2012

O que sobra do dia em que Merkel passou por Lisboa (com recurso às analogias)


No dia em que a imperatriz Merkel passou por Lisboa muita coisa foi dita, pouca coisa aconteceu – para além do aparato policial nas ruas. Mas uma frase de Passos Coelho, questionado no Forte em que ambos estiveram entrincheirados por receio da ‘populaça’, parece sintetizar bem toda a política que afanosamente prosseguem e tentam impor. Respondeu ele, confrontado com a persistência de uma política que vem apresentando resultados tão negativos e recorrendo à sempre útil analogia da saúde que “não podemos culpar o remédio (?) pelo estado do doente”!

À parte o destrambelho da frase, esta resposta é deveras paradigmática do estado de espírito destes perigosos fanáticos, a dúvida que subsiste é se tal sentença foi proferida com intenção ou se tratou de um descuido, daqueles em que, sem querer, foge a boca para a verdade. Seja como for, as convicções e os propósitos que animam a política deste (des)governo estão lá, do género ‘gato escondido com o rabo de fora’. Temos assim que, segundo Passos, a sua terapia para a crise (financeira, mas também económica, social e política) não é susceptível de contestação. Mas se a culpa do ‘calamitoso estado a que isto chegou’ não é da terapia, então só pode ser do doente, pois, pasme-se, ‘recusa’ curar-se... com esta terapia!

Como é óbvio, em dia de tantos discursos e sentenças, esta não foi a única afirmação digna de ser comentada. Retive ainda aquela de Passos de que a posição dos que contestam a política de austeridade em Portugal é minoritária – não obstante as claras indicações de rejeição sugeridas pelas sondagens (tão avassaladoras que não há margem de erro possível) e os esmagadores protestos de rua, a começar pelo de 15/Set.! Ou aquele mimo, tão sintomático do quão perigoso este (des)governo se está a tornar, de que aceitar a ideia da renegociação seria admitir o falhanço das suas políticas pelo que, perante a negação da existência de alternativas, isso significaria acentuar ainda mais a austeridade.

Nesta delirante sucessão de conceitos, o que mais sobressai é a desfaçatez como se transmite, sem pudor e até sem nexo, uma visão completamente invertida da realidade. À hora a que tinha lugar este pífio espectáculo de irrealismo ideológico (ainda que apresentado sob a capa de um irredutível pragmatismo) e não muito longe dali, no protesto que aguardava a dupla Merkel-Passos junto ao CCB, o músico e cantautor Carlos Mendes ilustrava para uma televisão o estado actual desta política recorrendo a uma outra analogia extraída da sua própria experiência em palco.  Disse ele que, quando o público não reage ou chega ao ponto de patear a actuação do artista, este apenas tem duas saídas: ou muda a música ou sai de cena!

Perante a pateada monumental com que este governo é recebido aonde quer que se desloque; perante a rejeição quase unânime da orientação política que nos desgoverna; perante o óbvio desastre económico e social para onde quer empurrar o País, Passos recusa mudar de ‘música’ – de política – ou sair de cena. Só resta mesmo uma saída: o País empurrá-lo daqui para fora – ou seja, cada um de nós! Antes que seja tarde demais para todos

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