Os 'donos da bola'
Não há, hoje, indicador económico
mais visado, a nível dos objectivos prosseguidos, das políticas a desenvolver
ou das análises críticas, venham elas da direita ou da esquerda, que o da
competitividade, seja nacional, empresarial ou mesmo individual. A competição
ergue-se como o supremo critério de validação da acção política, todas as
medidas são tomadas em nome da melhoria da posição competitiva do país, tudo se
subordina a esse imperativo de ‘sobrevivência na selva’ que é a
capacidade de cada grupo ou indivíduo superar os feitos dos ‘outros’.
A competição, é certo, faz parte
da vida, não é possível fugir a ela. Dir-se-á mesmo ser essencial ao
desenvolvimento, sem ela não haveria progresso por ausência dos indispensáveis
estímulos. Aparentemente, pois, todos a aceitam, ou a ela se sujeitam. Com base
no argumento de ser ela que melhor consegue atingir os níveis de eficiência que
modelam e onde assenta a evolução da Humanidade, a que mais contribui para
melhorar as condições materiais do homem.
Desenvolvem-se competências
individuais, exploram-se as vantagens comparativas nacionais. O objectivo é
criar melhores condições para competir, para vencer a concorrência, seja na
disputa de um lugar ou emprego numa empresa, ou na colocação de um produto ou
serviço no comércio mundial. Este modelo, levado ao extremo no sistema capitalista,
proporcionou desenvolvimentos ímpares na História da Humanidade. Contudo, ao
acentuar a selecção dos mais capazes produziu igualmente a exclusão,
ao fomentar a inovação e a criatividade incentivou o desperdício.
Não é, pois, apenas de benefícios ou aspectos favoráveis que é possível (e se
deve) falar quando se aborda o tema da competição, existe um outro mundo, não
menos impactante, para além dos êxitos que, justamente ou não, lhe são
atribuídos.
Para além do sobe e desce das estatísticas e do relativismo
que as caracteriza (diferenças de sector para sector, de região para
região,...) – quando não mesmo da sua manipulação – importa então considerar
pelo menos três níveis na análise da competição e da competitividade:
1. Quem
dita as regras do ‘jogo’ (o ‘jogo competitivo’)
2. Quem
suporta e lhe sofre os efeitos
3. Que
sequelas produz (para além das que a propaganda liberal difunde)
Fixemo-nos, por ora, no primeiro
ponto, tentando perceber como é que as regras da competição surgem e quem as
produz.
Na competição, como na vida em geral, quem manda são os ‘grandes’,
são eles que detêm o poder, ditam as regras e estabelecem as condições para o
seu exercício. São os ‘donos da bola’ das brincadeiras de crianças. No que
respeita ao denominado ‘desenvolvimento capitalista’, a competição fomentou e
produziu sociedades duais, constituídas na sua essência por um centro
industrial e tecnologicamente evoluído (o dos grandes operadores, países ou
empresas) e uma periferia fornecedora de recursos, materiais e humanos,
de pendor mais consumista (pontuada aqui e ali com laivos tecnológicos do
centro).
A evolução dos últimos trinta anos, com a ‘desregulação
dos mercados’, propiciou (entre outros) dois movimentos essenciais. Por um
lado, o dualismo capitalista alastra ao interior das empresas e dos países,
extremando as desigualdades sociais. Por outro, a grande Finança assume o
controle global das economias, dando lugar à financeirização total das
sociedades: tudo se encontra dependente do sector financeiro (e do que nele
aconteça), é ele que comanda as necessidades tanto dos povos como dos
indivíduos, que regula a produção e o consumo, que dita as regras de
convivência social e rege a própria democracia. O comando político deixou de
pertencer à democracia institucional transformada em mero auxiliar mediático do
poder financeiro.
(...)
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